10 de nov. de 2009

A legislação cambial precisa ser modernizada

Entre as alternativas em estudo no governo para tentar conter a sobrevalorização cambial, uma nova rodada de liberalização dos fluxos do balanço de pagamentos é a proposta que poderá ter impactos mais importantes e duradouros na economia.

Não será, seguramente, capaz de inverter a tendência de apreciação do real. Mas representará um novo passo num longo processo de desmonte dos excessivos controles cambiais vigentes no país.

Até os anos 1980, cidadãos cumpridores da lei e que pagam os seus impostos em dia eram obrigados a obter autorização prévia do Banco Central para comprar dólares para operações corriqueiras, como importar medicamentos. Existiam limites rígidos na aquisição de moeda estrangeira para viagens internacionais. As atividades dos doleiros eram toleradas, e os jornais divulgavam diariamente a cotação do dólar no mercado paralelo.

De lá para cá, boa parte dessas amarras foi desmontada. A unificação dos mercados de câmbio livre e flutuante em 2005, só para citar uma medida de grande alcance, criou um caminho mais transparente para empresas e cidadãos moverem recursos para dentro e para fora do país. Antes, isso era feito por meio das contas CC5. Por essa conta transitavam recursos legais e ilegais. A CC5 foi ganhando má reputação ao longo de inúmeras Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) destinadas a apurar escândalos financeiros, por seu uso em esquemas de lavagem de dinheiro.

Os avanços dos últimos vinte anos são inquestionáveis, mas ainda há muito o que fazer. Os fundos de pensão, por exemplo, são impedidos de aplicar recursos no exterior, salvo em situações especiais, observando um teto de 10% do seu patrimônio líquido. Essa é uma das regras que merecem ser reexaminadas na atual rodada de liberalização. Também seria adequado abrir o leque de possibilidades para os clientes terem acesso a produtos financeiros no exterior, por meio de bancos locais.

Em tese, a maior liberdade cambial permitiria aos indivíduos e aos fundos de pensão diversificar as suas aplicações, que hoje estão concentradas basicamente no Brasil. O Brasil oferece oportunidades de investimento com alto retorno. Mas os gestores devem se preocupar, também, em mitigar os riscos das suas aplicações por meio da diversificação das suas carteiras, sobretudo porque seus compromissos com os cotistas são de longo prazo.

Há, ainda, regras colocadas por algum burocrata que podem ter se mostrado úteis em determinado momento, mas que se perpetuam sem a menor razão. Exemplo disso é a obrigatoriedade da empresa que emite um ADR (American Depositary Receipts) fechar o contrato de câmbio e trazer os recursos para o país num prazo limite de cinco dias.

Uma maior liberdade para investir no exterior, porém, deve vir acompanhada de regulação mais firme. A atual crise financeira internacional é rica em exemplos de como instituições financeiras se aproveitaram de sua atuação global para fazer a chamada arbitragem regulatória, escondendo as suas operações onde as normas são mais brandas. Boa parte dos veículos de investimentos dos bancos que carregavam ativos imobiliários tóxicos estava localizada em paraísos fiscais.

Um problema que dever ser corrigido, portanto, é a falta de integração e troca de informações entre os órgãos supervisores. Esse é um dos temas em discussão no Forum de Estabilidade Financeira, organismo que toma a frente nas negociações internacionais para fortalecer o sistema financeiro global.

Tradicionalmente, o Brasil tem mantido a prática de, ao mesmo tempo em que libera os fluxos de capitais, exigir controle das atividades de instituições brasileiras no exterior. Os bancos podem manter ativos no exterior, por exemplo, apenas se os fiscais do BC puderem checá-los. No caso dos fundos de pensão, serão fundamentais regras que assegurem controles semelhantes aos órgãos reguladores, além de limites para os riscos assumidos.

Nessa nova rodada de liberalização cambial, também será prudente que o governo mantenha a prerrogativa de, em caso de emergência, voltar a lançar mão de controles cambiais, por meio de decisões do Conselho Monetário Nacional (CMN). Hoje, o ambiente é de excesso de dólares, mas os fluxos de capitais estão sempre sujeitos a paradas súbitas.

Fonte:Valor Econômico

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